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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Visão de Jogo #38: A Copa do Mundo de 2023

A vez é delas na Coluna Visão de Jogo. Nosso colunista fala da importância e da história da Copa do Mundo Feminina e as chances do Brasil

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Por Luiz Henrique Borges

As principais seleções de futebol feminino do planeta estarão reunidas entre os dias 20 de julho e 20 de agosto de 2023 para disputar a nona edição do Mundial Feminino. A competição, organizada pela FIFA, começou a ser realizada, em 1991, na China. No entanto, a história é mais antiga e pouco divulgada. Vamos a ela! No final da década de 1960 e no início da seguinte, mulheres desbravadoras e corajosas – uma vez que as federações e confederações não se preocupavam com o futebol feminino – participaram dos primeiros torneios intercontinentais de seleções.

Superando o conservadorismo e a ideia de que o futebol feminino não passava de um espetáculo circense para entretenimento de pessoas curiosas, alguns empresários italianos consideraram a participação da mulher no futebol como uma oportunidade de expansão da modalidade e também uma possível fonte de receitas. Nesse sentido, em 1969, eles organizaram o primeiro torneio de seleções da Europa. O sucesso da empreitada estimulou a criação da FIEFF – Fédération Internationale Européenne de Football Féminine. A nova organização, uma instituição de seleções nacionais femininas, não era filiada à UEFA ou à FIFA.

No ano seguinte, 1970, a FIEFF, presidida por um alto executivo da empresa de bebidas italiana Martini & Rossi, organizou um torneio que seria uma espécie de Copa do Mundo Feminina. A referida empresa patrocinava diversas modalidades esportivas e também os torneios promovidos pela FIEFF. Por isso, a Copa do Mundo acabou ganhando o nome de Martini Rosso Cup.

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O Brasil foi convidado para participar da competição, na figura da antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD), mas declinou do convite uma vez que havia uma lei, de abril de 1941, que proibia a “prática de esportes incompatíveis com a natureza feminina” e o futebol seria um deles.

A decisão da Martini Rosso Cup envolveu o país anfitrião, a Itália, contra a Dinamarca. Seis meses antes, elas haviam feito a final do Campeonato Europeu de Seleções e as italianas venceram as suas oponentes por 3 a 1. Dessa vez, a Dinamarca, que usou o uniforme do Milan uma vez que a delegação havia perdido os seus uniformes antes da final, não foi uma visitante afável e derrotou a Itália por 2X0.

No decorrer da década de 1970, diversos países, dentre eles o Brasil, suspenderam as proibições da prática do futebol feminino e alguns torneios internacionais foram disputados até chegarmos ao ano de 1991 quando, como já foi dito acima, foi disputada, oficialmente, a primeira Copa do Mundo organizada pela FIFA. De lá para cá, a cada quatro anos, a competição é disputada e em suas oito edições, quatro seleções se sagraram campeãs: os Estados Unidos que são tetracampeões, a Alemanha que levantou a taça em duas oportunidades, o Japão e a Noruega, ambos os países com um título.

Apesar do evento já estar consolidado, as discrepâncias com a Copa do Mundo masculina ainda são perceptíveis. Talvez o melhor exemplo seja o financeiro. Apesar da FIFA ter direcionado, para a Copa do Mundo feminina, recursos mais polpudos, ainda assim, a quantia nem arranha o que é destinado à Copa masculina. As jogadoras irão competir, em 2023, por um prêmio de U$ 4,29 milhões, já a seleção masculina da Argentina, campeã em 2022, recebeu a bagatela de U$ 42 milhões, ou seja, dez vezes mais do que o prêmio final oferecido para às mulheres.

As explicações que “justificam” a discrepância se apoiam nos seguintes argumentos: a falta de interesse do público na modalidade, a pouca atenção da mídia aos jogos, a diferença da qualidade do jogo e as diferenças dos valores do lucro das competições masculinas e femininas. Os argumentos são discutíveis e, no meu entender, não se atentam para a seguinte questão: se não há visibilidade, não há investimento e sem investimento não há visibilidade.

Outro aspecto que precisa ser refletido é a própria questão de gênero. E o que vem a ser isso? O gênero deve ser entendido como aquilo que diferencia socialmente homens e mulheres. Desde cedo, a sociedade espera por determinados comportamentos das meninas e dos meninos. Não é esse o preceito em que se baseia a lei que proibiu a prática do futebol entre as mulheres em 1941? O futebol, desde a sua origem, ficou atrelado ao sexo masculino. A agressividade do jogo era vista como pouco adequada à “natureza frágil e sutil da mulher”. Historicamente, o pensamento machista afirmou que “futebol não é coisa de mulher” e mesmo que tal concepção esteja superada, ao menos para os mais esclarecidos e arejados, o futebol feminino ainda é percebido com desdém por uma parte da sociedade.

A Copa do Mundo feminina, que acabou de dar, nesta semana, o seu pontapé inicial, é um sopro benfazejo, inclusivo e revigorante para o futebol. O campeonato promete jogos de alto nível, extrema competitividade e grande participação do público. Ele jogará por terra, demolirá, as justificativas daqueles que desmerecem a modalidade. É mais um grande espetáculo que teremos a oportunidade de assistir e que pode, em 2027, ser sediado pelo Brasil.

Em decorrência dos bons resultados sob o comando da treinadora sueca Pia Sundhage, as expectativas em relação à participação brasileira são altas, apesar de não sermos uma das favoritas ao título. As adversárias que já se apresentam no horizonte brasileiro são duríssimas e para repetirmos a campanha que nos levou à final da competição em 2007, teremos que superar diversas potências nesse esporte.

O Brasil, já na primeira fase, enfrentará uma oponente que se encontra na prateleira superior do futebol feminino, a França. Quem sabe não é a hora de vencer pela primeira vez as francesas e ter um caminho um pouco menos árduo na fase seguinte? Mas se isso não ocorrer e ficarmos na segunda posição do grupo, o caminho será uma autêntica pedreira. A tendência é jogarmos contra a bicampeã mundial, a Alemanha, nas oitavas de final. Se repetirmos a vitória recente que tivemos contra as alemãs, seguindo a lógica, devemos enfrentar a Inglaterra, atual campeã europeia. Depois podemos reencontrar a França ou enfrentar a Austrália e, mantendo o status de zebra, decidir o título contra os Estados Unidos ou a Espanha.

Superar a campanha de 2019, quando saímos nas oitavas de final, é algo palpável e deve ser o nosso primeiro objetivo. Mas em competições de tiro curto, uma sequência de bons jogos e uma boa dose de sorte, o que sempre é necessário quando se joga os mata-matas, o Brasil pode até surpreender e ganhar sua primeira estrela na Copa do Mundo feminina, mesmo que não seja muito provável. Mas quem não gosta de sonhar? Eu gosto!

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