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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Visão de Jogo #37: As ligas de futebol no Brasil

Em mais uma edição da coluna, Luiz Henrique Borges discute os planos de criação de duas ligas de futebol: Libra e Liga Forte Futebol

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Por Luiz Henrique Borges

O nosso futebol movimenta anualmente bilhões de reais com a venda de produtos, com os programas de sócio torcedor, com as vendas dos direitos de transmissão, com a negociação de atletas, com as vendas de ingressos, entre outras atividades. Um estudo recente encomendado pela CBF e realizado pela empresa de consultoria “EY”, com o objetivo de entender o impacto do futebol para a economia do país, concluiu que o principal esporte nacional movimenta, anualmente, aproximadamente R$ 52,9 bilhões, ou seja, 0,72% do nosso Produto Interno Bruto (PIB). Enfim, ele é um setor produtivo que impacta a economia brasileira, inclusive indiretamente. Quantos bares e restaurantes, por exemplo, não aumentam o seu faturamento nos dias dos jogos?

Com o intuito de explorar de forma mais eficaz o negócio e, particularmente, a internacionalização das marcas, os clubes perceberam a necessidade de formar uma liga para gerir com mais eficiência o nosso futebol. A ideia é a de que a negociação em conjunto valorize o produto e com isso aumente o faturamento dos clubes. A parte consensual acaba por aqui.

No momento, há dois grandes grupos que dirigem o movimento: a Liga do Futebol Brasileiro (Libra) e a Liga Forte Futebol (LFF). Ambas são assessoradas por empresas de mercado e já contam com investidores para a aquisição de parte da liga. Há ainda um terceiro grupo, que eu denomino de independentes, encabeçado por Botafogo, Coritiba, Cruzeiro e Vasco.

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No meu entender, a divisão enfraquece a capacidade de negociação dos clubes. No entanto, o motivo principal para a separação, e não seria outro, é a desigualdade na distribuição dos valores das receitas que envolve audiência e colocação no torneio. Uma equação quase impossível de ser resolvida como veremos.

Neste mês, oito clubes que formam a Libra assinaram um contrato de exclusividade com o fundo Mubadala Capital, dos Emirados Árabes, para a negociação da venda dos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro de 2025 e os clubes da Liga Forte Futebol, acrescido dos independentes que não fazem parte da LFF, fecharam um acordo com a Serengeti Asset Management e a Life Capital Partners.

Como botafoguense, entendo que a aproximação com a Liga Forte que defende uma distribuição mais equilibrada dos recursos foi uma excelente opção tomada pelo alvinegro carioca. Meu afastamento da Libra se dá única e exclusivamente pela disparidade de recursos que Flamengo, Corinthians, São Paulo e Palmeiras receberão em detrimento das demais equipes.

O Botafogo, por exemplo, receberia inicialmente, pela Libra, o valor de 159,5 milhões de reais, ou seja, praticamente metade do valor, 316 milhões de reais, que é destinado ao clube mais popular do Brasil, o Flamengo. Já na proposta da Liga Forte Futebol, o Flamengo continuaria sendo o clube mais bem remunerado, 221,5 milhões de reais, mas a diferença para os demais times é reduzida. O Botafogo, na última semana, acertou com os investidores da Liga forte e receberá da Serengeti e LCP o valor de 184 milhões de reais.

A ideia da Liga Forte, como já foi destacado, é ter uma distribuição mais equilibrada. Os 13 principais clubes do futebol brasileiro receberiam valores mais próximos, entre R$ 180 milhões e R$ 220 milhões. O destino do dinheiro “retirado” do topo da tabela seria distribuído entre os times da parte de baixo.

Não gaste o seu tempo e lábia com argumentos que buscam apenas te favorecer, torcedor dos clubes privilegiados. Eu não preciso que ninguém me fale que o Flamengo (21,8%), o Corinthians (15,5%), o São Paulo (8,2%) e o Palmeiras (7,4%) possuem as maiores torcidas do Brasil, e, consequentemente, um potencial mercadológico superior, mas a distribuição proposta pela Libra significa, na prática, eternizar os quatro clubes no topo do futebol nacional e, em última instância, reduzir a capacidade de competitividade dos demais.

Como já falei alhures, não há nada mais difícil do que dividir melhor a renda. Como o dinheiro, infelizmente, não nasce em árvores, para que a distribuição seja mais equânime é necessário que os clubes mais bem aquinhoados abram mão de alguma coisa em favor dos mais pobres. Como isso é difícil! O atrito entre dirigentes do Palmeiras e do Flamengo, em abril deste ano, é um exemplo de que, quando se trata do vil metal e da manutenção dos privilégios, até os ricos e poderosos se desentendem. A Libra foi fundada com uma regra que exige unanimidade para qualquer alteração na distribuição das receitas. Quando, no final de fevereiro, discutiu-se a possibilidade de alterar a questão da unanimidade, o Flamengo deixou claro que não iria renunciar ao poder de vetar mudanças nas regras de divisão do dinheiro entre os clubes da Libra. O temor dos dirigentes do clube carioca é que, depois de aprovada a Liga e sem o poder de veto, outros participantes da Libra decidam acabar com a garantia de manter os robustos ganhos atuais do rubro-negro. Da mesma forma que ocorre na sociedade, ninguém quer deixar os seus rendimentos em prol do coletivo.

  Surge, então, uma pergunta. Por que os clubes mais ricos deveriam abrir mão de uma parte das receitas em prol dos menos favorecidos?

Se o produto a ser vendido possui uma qualidade maior, o valor a ser cobrado também pode ser mais elevado. Em outras palavras, uma divisão mais justa significará um jogo de ganha-ganha, ou seja, os clubes podem reforçar os seus elencos, o que, por sua vez, irá reverberar em campeonatos mais competitivos e emocionantes, capazes de atrair um número maior de espectadores, de vendas mais elevadas dos produtos dos times, de faturamentos e até futuros contratos mais robustos, além de ajudar na internacionalização das marcas.

Os benefícios do fortalecimento dos clubes brasileiros não darão frutos apenas nas competições nacionais e mesmo internacionais, mas os próprios regionais, como o Paulistão ou o Campeonato Carioca, entre outros, ficarão mais atrativos e alcançarão valores também melhores de venda. Quanto menos hegemônicos forem os clubes, maior será a competitividade dos campeonatos e todos – clubes, dirigentes, atletas, comissões técnicas e torcedores – poderão sair ganhando.

 A hegemonia se parece muito com o conceito de verdade, pouquíssimos se beneficiam dela. Eu costumo dizer para os meus alunos de História que a Verdade, com V maiúsculo, aquela que não comporta discussões, críticas ou reflexões, só é útil para ditadores e fanáticos religiosos. O mesmo vale para a hegemonia, ela favorece apenas o grupo que conseguiu alcançá-la, os demais são os eternos coadjuvantes do baile.

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