Por João Marcelo
Desde o anúncio do governador Ibaneis Rocha, que determinou a pausa dos eventos esportivos devido ao Coronavírus, já são mais de um mês sem a prática dos desportos no Distrito Federal. Por conta disso, os atletas procuram alternativas para não perder o rendimento nas suas respectivas modalidades e os treinos em suas residências se tornaram frequentes. Mas ainda há alguma forma de elevar seu nível de preparo? A equipe do Distrito do Esporte procurou dois psicólogos para detalhar como o poder da mente é indispensável neste momento.
O psicólogo do esporte e presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte (APPE), Dr. João Ricardo Cozac, conversou com a equipe do DDE sobre diversos pontos da psicologia do esporte, onde o profissional da saúde concluiu doutorado pelo laboratório de Psicossociologia do Esporte da Universidade de São Paulo. Dentre os assuntos tratados, o impacto no nível de concentração, a redução dos danos físicos e a importância do trabalho psicológico nos clubes.
O árbitro de futebol do quadro da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Rodrigo Raposo, e o lateral-direito do Formosa, Glauber Couto, também citaram como a mente pode ser trabalhada neste período de isolamento social e o que estão fazendo para manter o alto rendimento. Além deles, a psicóloga Márcia Raposo falou sobre como são importantes os processos da psicologia e como a reestruturação da mente é fundamental.
Árbitro Rodrigo Raposo cita momentos de estudo, fortalecimento da mente, teletrabalho e a relação com sua família
O árbitro Rodrigo Raposo cita o trabalho da CBF para o fortalecimento da mente. “Nós temos uma psicóloga disponibilizada pela CBF, Marta Magalhães, para os árbitros do quadro. Ela nos passa tarefas, filmes e livros para fortalecer a nossa mente. Além disso, eu contrato um programa de psicólogos chamado de ‘Atleta Campeão’. Têm atividades diárias onde eu chego a tirar de 30 minutos a uma hora para fazer esse lado psicológico”, disse Raposo.
Outro fator positivo para Raposo é o cuidado com seu primeiro filho, Vitor Bontempo Raposo, de 4 meses. “Se tiver um lado positivo dessa pandemia, é o período que estou passando na paternidade. Eu estou vivenciando isso 24 horas por dia, então é muito bom. Como é meu primeiro filho, fortalece muito também. Dou muito mais valor nessas tarefas diárias de pais, junto com a minha esposa. Pois se eu tivesse no trabalho, sou servidor público (Raposo trabalha na Secretaria de Economia do DF desde 2005), trabalhando de manhã e a tarde, talvez não perceberia tanta coisa que é preciso para um bebê”, descreve.
Raposo acredita no potencial da mente como fator primordial no período de isolamento social. “A gente tem que trabalhar a mente, assim como trabalhamos o físico. Eu diria que é fundamental nessa época de pandemia, pois têm muitas informações negativas e pode nos levar a pensar da mesma forma. Acredito muito no poder da mente, se bobear, é mais de dois terços de tudo o que a gente faz. Aproveito esse tempo para fazer análise da carreira, da minha vida, de tudo”, diz.
O árbitro ainda detalha como está sua rotina de treinamentos. “Trabalho em casa com um personal. É todo um ciclo que o árbitro precisa ter, tanto o psicológico como o físico. Mesmo que não seja registrado (a profissão de árbitro de futebol), agimos como profissionais. Não podemos estar abaixo quanto tudo voltar, por isso tiro tempo para parte física, funcionais, alongamentos e corridas, que são essenciais. Fiquei sem correr uma semana e quando voltei, senti bastante, então procuro manter.”, finaliza.
Preocupação e cuidado são palavras-chaves para o lateral Glauber e a psicóloga Márcia Raposo
O lateral-direito do Formosa, Glauber Couto, disse estar cuidando da saúde e tomando os devidos cuidados. “Estou tentando me desligar um pouco das notícias, pois isso nos afeta bastante. Passo álcool em gel, faço a higienização das mãos, tudo o que nos indicam para não correr riscos”. O atleta ainda citou como o medo da pandemia atrapalha. “Eu fico preocupado e já penso quando voltar o futebol. Tenho família longe e ficarei pensando: será que eles estão bem? Fica difícil a total concentração.”, relatou.
Glauber ainda disse estar tentando manter sua forma, mas que nota a diferença do seu rendimento. “Eu mantenho os meus treinamento em casa, claro que não é a mesma coisa, mas procuro exercitar meu corpo. Tudo isso para caso volte a competição novamente, eu estar com mais ou menos 70% (do rendimento)”, concluiu o jogador.
A psicóloga Márcia Raposo cita a admiração pelo seu irmão, o árbitro Rodrigo Raposo, e como o ajuda com a psicologia. “Eu admiro muito o Rodrigo pela coragem em assumir e desempenhar tão bem uma profissão que desperta diferentes emoções e significados nas pessoas. E eu, enquanto irmã, me preocupo em como ele lida com vivências positivas e desagradáveis da profissão, por isto, incentivo-o frequentemente a cuidar da saúde mental”, expressa.
“Devido ao nosso parentesco, eu não faço atendimento psicológico com ele, mas trocamos conversas, materiais, vídeos e instrumentos que possam ajudar a mantê-lo em equilíbrio frente às adversidades. Atender cliente externo é mais fácil porque é uma pessoa que está disponível em falar a fundo sobre a sua história de vida. Algo que pode não acontecer com um cliente familiar, pois ele pode não se sentir confortável em falar algum assunto importante e isto afetará o tratamento”, discorre.
Raposo aponta a relevância do intelecto. “Os processos mentais são os grandes responsáveis pelo modo como tomamos decisões e nos comportamos. Por isso, é tão importante os atletas cuidarem da saúde mental. É preciso ficar atento aos pensamentos disfuncionais que podem ocorrer neste período da quarentena e, se preciso for, procurar ajuda psicológica online para reestruturar os pensamentos inadequados e regular as emoções.”, encerra.
Dr. João Ricardo Cozac esmiúça o poder da mente em prol do alto rendimento dos atletas
Ao iniciar suas falas, o Dr. João Cozac expõe sua postura quanto à volta dos esportes. “Em primeiro lugar, eu queria deixar claro que sou radicalmente contra a retomada de qualquer campeonato que seja de futebol no momento. O país vive uma situação delicada e o futebol é um esporte de contato. Mesmo que não haja torcida, as confederações precisam ter responsabilidade, são vidas em jogo. A prioridade máxima é daqueles que vão trabalhar. As pessoas estão transpirando, expirando, um ao lado do outro, já colocariam todos em risco”, manifesta.
O desconhecimento da área ainda é algo comum para o doutor. “Ainda há muito preconceito e desinformação sobre o trabalho psicológico. É um recurso científico primordial para o alto rendimento individual e coletivo. Nesse momento as emoções são testadas ao limite, muitos jogadores me procuraram para fazer trabalhos individuais para diminuição do stress mesmo antes da pandemia. As equipes que reconhecem o valor da psicologia do esporte, que tem esse departamento, tem vantagem”, declara.
Quanto ao foco dos atletas, Dr. João Cozac menciona prejuízos. “O nível de concentração certamente poderá ser afetado, pois a anisedade aumenta bastante, relacionada ao medo, a ameaça de contrair o Covid-19. O nível das respostas neuromotoras dos jogadores é afetada também, sem dúvidas. Os clubes deveriam estar atentos a isso. Eu digo há 30 anos atuando como psicólogo do esporte do Corinthians, Palmeiras, Cruzeiro e Goiás: a presença do psicólogo não garante a vitória, mas a ausência pode representar a derrota em vários momentos”, exprime.
Por fim, o profissional da saúde declara que uma assistência psicológica junto aos atletas será de enorme valia. “O trabalho psicológico, um acompanhamento individual dos atletas, pode sim reduzir o nível de dano na qualidade do alto rendimento. A recomendação é que as equipes que não tem o trabalho do psicólogo do esporte se atentem à essas demandas. Essa área da preparação esportiva vai ser muito requerida quando os campeonatos voltarem. Sob tudo em condições anormais, com as, certamente, arquibancadas vazias. Terão muitas variáveis que poderão interferir no comportamento esportivo dos atletas.”, completa.
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