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sábado, 23 de novembro de 2024

Sala de imprensa #19: O utilitarista e o Brasiliense

Você, caro torcedor, não precisa querer o sucesso do Brasiliense, mas pelo seu próprio bem, deve rezar para que ele suba à Série C

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O texto se trata de um artigo de opinião e, portanto, é de inteira responsabilidade de seu autor. As opiniões nele emitidas não estão relacionadas, necessariamente, ao ponto de vista do Distrito do Esporte.
Por Bruno Henrique de Moura*

 

Jeremy Bentham, James Mill e John Stuart Mill são os tres principais expoentes de uma corrente filosófica chamada utilitarismo. De origem judaico-Cristão, essa filosofia, em resumo, advoga que nossos atos e comportamentos devem basear na busca pela felicidade e pelo bem-estar, analisando sob a ótica daquilo que nos gera felicidade a correção dos nossos atos. Um dos mais famosos exemplos é a anedota do trem.

Você, caro leitor, está ao lado de uma alavanca que muda o curso de um trem em alta velocidade. Há duas pistas: pista A e pista B. Na primeira, em que o trem está se locomovendo, 5 pessoas estão amarradas e serão mortas pelo veiculo se você não acionar a alavanca e direcionar o trem para a pista B. Porém, na pista B, uma pessoa está amarrada. Alguém, ou alguns, necessariamente morreram. Você pode acionar a alavanca e deixar um só ser atropelado fatalmente, ou permanecer em inércia e ver 5 morrerem. O que você faria?

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Você, leitor, provavelmente ponderará as consequências dos seus atos para tomar essa decisão. Essa ratio é chamada de consequencialismo na filosofia e nada mais é que a avaliação dos seus atos conforme os resultados esperados.

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A resposta do utilitarismo, além das consequências que você ponderá, é: qual dessas decisões te trará mais felicidade? Na acepção individual da palavra. O que levará a um maior conforto mental por parte do agente da decisão?

O princípio da utilidade significa aquele princípio que aprova ou desaprova cada ação de acordo com a tendência que apresenta a aumentar ou a diminuir a felicidade daqueles cujo interesse está em jogo; ou, o que é o mesmo em outras palavras, a promover ou se opor àquela felicidade. Eu digo de toda e qualquer ação, e portanto não somente de toda ação de um indivíduo privado, mas também de toda medida de governo (Bentham. 1948, p. 2)

Brasiliense x Anápolis - Série D do Campeonato Brasileiro
Foto: Luã Tomasson/ Brasiliense

Às 15:30 de hoje (01/09) o Brasiliense entrará em campo no Serejão em busca da classificação à Série C, diante do Retrô (PE). Há uma década o jacaré tenta retomar a 3* divisão.

Leio, no parco tempo que decido ao futebol do DF, duas posições antagônicas. De um lado quem torce pelo sucesso do Brasiliense, seja pelo amor à agremiação, seja pelo bem do futebol do DF. Do outro lado, aqueles que vibrarão em mais um fracasso do Brasiliense, unicamente por torcerem para rivais do jacaré e desejar o pior possível para o time dos Estevão.

Ambas as posições são respeitáveis e, sob uma perspectiva utilitarista, tem seu lugar ao sol. Todavia, como toda questão filosófica, há sempre mais camadas escondidas nos dilemas morais – o utilitarismo é uma corrente da filosofia ética.

Normalmente, a resposta à indagação da anedota do trem é acionar a alavanca e matar apenas 1 indivíduo, por um critério matemático. Mas e se ele fosse seu filho ou um amigo querido e os demais desconhecidos? Ou se você soubesse que os 5 são doentes terminais ou idosos com poucas semanas de vida e o único na pista B é uma criança? 5 criminosos condenados e um inocente? Algo mudaria sua avaliação?

A questão sobre torcer, comemorar ou, ao menos, ser indiferente ao jogo do Brasiliense não pode se reduzir a gostar ou desgostar do Jacaré. Cidades de menor porte que, nos últimos anos, tiveram times com acesso à Série C mostraram um crescimento no seu esporte como um todo. O melhor exemplo é Amazonas que após acesso do a Amazonas viu o crescimento do Manaus – ainda que por pouco tempo. Exemplos no sul do pais, em que Brusque, Londrina, Criciúma e Avai aproveitaram uma temporada de sucesso no seu futebol local, tal qual os gaúchos São José e Ypiranga e, atrevo-me a colocar nesse limbo, Anápolis e Aparecidense – a despeito do rebaixamento desta última para a Série D de 2025.

O que lhe trará mais felicidade: a queda do Brasiliense, com uma semana de regojizo pela derrocada do rival, ou o acesso do jacaré trazendo mais mídia ao futebol local, gerando nos dirigentes das outras equipes um dever de sucesso e fazendo com que o ambiente do esporte gere uma maior profissionalização e investimento nos demais clubes?

Você, torcedor do Gama, prefere seu rival mais um ano na Série D ou que ele suba à Série C e isso provoque uma externalidade positiva para que os dirigentes e patrocinadores do Gama façam um time competitivo para que em 2027 vocês estejam na Série C?

Na filosofia utilitarista, James Mill pondera que a categoria felicidade, deriva da soma dos totais individuais, os quais são, senão matematicamente, indistinguíveis entre si, equivalentes. Portanto, felicidade não é um uno solitário de episódios esparsos, mas a soma de vários fatores que levam a uma felicidade mais amplo, finalística.

Este autor, assumidamente torcedor do Formosa Esporte, sem sombra de dúvidas, vai adotar a corrente consequencialista: estarei de amarelo pelo acesso do Brasiliense hoje, o que levará, pelo todo do futebol do DF, daqui a uns anos, ao sucesso do meu Tsunami do Cerrado.

 

Bruno Henrique de Moura é ex-presidente da ABCD, vice-presidente da Comissão Nacional Disciplinar da Confederação Brasileira de Desporto Universitário (CBDU), advogado e sócio do Distrito do Esporte. Possui passagens pelos veículos JOTA, Estadão, Esportes Brasília, Nova Aliança, Rádio Mais Brasil News, TV Câmara Distrital, dentre outros. É pesquisador bolsista CAPES, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP) e do Grupo Direito Penal e Estado Democrático de Direito da FD-USP. Professor assistente da Escola de Comunicação e Artes da USP.

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