O texto se trata de um artigo de opinião e, portanto, é de inteira responsabilidade de seu autor. As opiniões nele emitidas não estão relacionadas, necessariamente, ao ponto de vista do Distrito do Esporte.
Por Bruno Henrique de Moura*
O título do Ceilândia, após um gap de 12 anos, diz mais que a consolidação de uma boa campanha neste ano de 2024. Ela traduz sinais esportivos e políticos e marca uma mudança considerável nas forças do nosso futebol candango.
É importante compreendermos que a medição desta força entre clubes de um mesmo Estado depende de alguns fatores e vai se modificando conforme as relações se alteram. Torcida, patrocinador, categorias de base, elenco, treinador, presidente, estrutura física, tudo isso conjuga a existência, o sucesso ou o fracasso de uma agremiação. Em estados com menos tradição esportiva, as relações políticas, partidárias e não partidárias, influem ainda mais.
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Desde o primeiro título do Ceilândia, em 2010, o time da então maior região administrativa – ultrapassada pela órfã, futebolística, Águas Claras – aproximou-se de grupos políticos consolidados no Distrito Federal, primeiro do PT, mais recentemente ao MDB. Isso foi essencial tanto para o caneco primar, quanto para o segundo título em 2012. O Ceilândia não se afastou destas relações na década seguinte, mas após o frustrante campeonato de 2020 – resultado de um descontrole orçamentário em 2019 -, reergueu-a em 2020, mantendo-se nas cabeças em 2021, 2022 e oscilando em 2023, consolidando-a em 2024.
Na mesma medida, o time sacramentou 2 fortes patrocinadores, o que, para um campeonato que se tornou caro, transforma-se em essencialidade. Se o custo é alto, jogar dinheiro pelo ralo é inadmissível. O quarteto Almir, Adelson, Ari e Vilson de Sá não podiam errar. E não erraram.
A crescente influência do Ceilândia dentro da FFDF não pode ser desprezada. O Gato Preto, que há anos era um clube isolado e considerado encrenqueiro, hoje é ponta de lança do apoio a Daniel Vasconcelos e articula as principais decisões coletivas da elite candanga. Isso pôde ter sido visto no arbitral do Candangão 2024 e com relevância política à manutenção do BRB como patrocinador chave.
As relações políticas dizem muito e trazem, para o analista, elementos de compreensão sobre o que ocorreu para o resultado vencedor, mas também sobre o que deve acontecer no futuro. O Poder não restringe a posicionar as velas do barco, mas acesso mais robusto a recursos e ao controle administrativo – à cabine de comando.
A palavra de um time que ganha títulos traduz legitimidade nas escolhas de Tribunal, diretorias técnicas, comando da arbitragem.
Quando o Gama dominava, quase solo, o cenário local, era ele o principal considerado pela então Federação Metropolitana. Nos anos de ouro do Brasiliense, o Jacaré era consultado a cada passo. Antigamente, na era Taguatinga e Brasília, idem. Isso tudo tem sentido prático, mas muito mais político. É um moinho que se retroalimenta.
Esse campeonato diz muito sobre o passado recente e como algumas forças vão perdendo comando.
O Gama segue mais um ano sem calendário recheado, ainda que tenha arrumado a bagunça política administrativa de Weber Magalhães e Arilson Machado com o responsável Wendel Lopes e a chegada da forte retaguarda dos Caputo Bastos. Mas o problema maior do alviverde é o fogo amigo interno, de uma turma que pensando que ajuda – vamos adotar que eles têm boas intenções -, só atrapalha. Os 5 anos de marasmo resultam num distanciamento do Periquito do núcleo político da FFDF.
Quem segue o pêndulo de boas e medianas campanhas é o Brasiliense. Muito, talvez, por um apetite mal direcionado. Nos bastidores, não se acha um indivíduo que normalize ou concorde com o controle financeiro e político de mais duas agremiações – Ceilandense e Samambaia –, avizinhando-se uma terceira: o Taguatinga. Mas os dirigentes, uns por conveniência, outros por covardia, fazem ouvidos moucos.
Agora, enquanto os Estêvão jorram dinheiro em outras equipes e controlam, ao menos, 30% dos clubes da elite, o Brasiliense está cada vez mais isolado do epicentro das decisões. Veja, ninguém é louco de deixar de fora um informe ou consulta a Luiz Estêvão. Ele segue sendo informado de tudo antes de virem a publico e algumas idiossincrasias, como a mudança da data do jogo de ida entre Brasiliense x Capital ainda, são adotadas com pouca resistência administrativa.
Mas erram os que pensam que nesta administração o amarelo dá as cartas como fora em anos passados. A reeleição antecipada de Daniel Vasconcelos, que deixou os planos dos Estevãos de comandar a FFDF pelo próximo ciclo, é o melhor exemplo disso. Hoje, aprendeu-se a lidar com a esfinge, que muitas vezes não está compreendendo que seus enigmas são decifrados mui antes do tempo previsto.
O amarelo vem perdendo força, enquanto o azul o ganha. O ponto de corte, e prevejo que ele vá perdurar ao menos por dois anos, foi a polêmica marcação de Brasiliense x Capital para uma quinta-feira. Godofredo ficou possesso e tentou, de todas as formas, modificar a decisão de Estêvão. Não conseguiu. Todavia, como eu disse no Tá Na Rede da Tv Câmara Distrital, aquilo tudo era mais sobre o jogo psicológico de Luiz Estêvão que sobre a mudança de data. Godofredo quase caiu na armadilha, mas não se deixou levar. Essa inteligência emocional que, nos anos anteriores, transformaram o alto investimento financeiro em fracasso, neste ano foram o sucesso do time. O Capital passou o carro no Brasiliense e conseguiu calendário, finalmente. Nos bastidores, a coruja, animal de inteligência e avidez invejáveis, começou a jogar com estratégia e não com o fígado. As previsões são alvissareiras e mostram um horizonte para daqui a 4 anos.
Nesse novo tabuleiro de forças, precisamos destacar dois clubes que, a despeito de não estarem na antessala da presidência, estão ganhando espaço pelos resultados apresentados, mas ainda pecam na articulação.
Paranoá, que pela terceira temporada quase chega, vão galgando terreno, mas ainda falha em imprecisões administrativas. A primeira: estádio – ou fica no JK, ou adota outra cidade. Defelê, Rorizão, não lhe servem. A segunda: treinador – abrace alguém e siga com ele de cabo a rabo.
Real Brasília dá resultados, na base e no profissional. Oscilações são normais e dependem de vários fatores, mas o antagonismo aos Estevão então esperado pela claque não se consolidou. Há um fator CLDF nisso tudo, e agora, ainda mais, financeiro. A conta não fecha, e por não fechar, está na hora de se reestruturar.
Por fim, há de se observar se a receita campeã, resultado de 4 anos de retrabalho muito bem planejados, será atravessada por uma troca de objetivos, que podem confundir quem controla a proa do gato preto. A barba foi feita, falta o cabelo em 2025. O bigode, em 2028, se mal desenhado antes da navalha chegar ao buço, pode sangrar além da conta.
Bruno Henrique de Moura é presidente da ABCD, vice-presidente da Comissão Nacional Disciplinar da Confederação Brasileira de Desporto Universitário (CBDU), advogado e sócio do Distrito do Esporte. Possui passagens pelos veículos JOTA, Estadão, Esportes Brasília, Nova Aliança, Rádio Mais Brasil News, TV Câmara Distrital, dentre outros. É pesquisador bolsista CAPES e do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), onde pesquisa assédio judicial e atua como professor assistente na mesma instituição.