Por Luiz Henrique Borges
Finalizada a Copa do Mundo, o primeiro desafio da CBF para o próximo ciclo, que será meio ano mais curto, é escolher o novo treinador da Seleção Brasileira. Meses antes do Mundial, Tite já havia anunciado a sua saída, independente do resultado. Na expectativa de conquistar o hexacampeonato, o treinador brasileiro acreditou que o mercado europeu se abriria para ele, como se deu com Carlos Alberto Parreira em 94, quando foi comandar o Valencia e com Luiz Felipe Scolari em 2003, que se tornou o técnico da Seleção Portuguesa. Após a eliminação para a Croácia, a imprensa divulgou que o estafe de Tite trabalha com cinco ofertas, de três seleções e dois clubes da Europa, mas não há pistas dos interessados. Certamente, o treinador gaúcho saiu do Mundial bem menor do que entrou, o que me faz pensar se há efetivamente o interesse divulgado, ou não seria apenas uma estratégia dele e de seus assessores de tentar recuperar algo do prestígio perdido. Se há o interesse, resta uma outra pergunta: os supostos pretendentes figuram na primeira prateleira do futebol mundial?
Bem, os caminhos que o Tite seguirá não fazem parte do meu rol de dúvidas. Da minha parte, no momento, eu tenho duas grandes curiosidades, a primeira, relacionada às mudanças políticas gerais e no local em que trabalho: quem será o novo ou a nova presidente do Iphan e a segunda questão, quem dirigirá a Seleção Brasileira.
Distinto de diversas outras escolhas para um dos mais espinhosos cargos existentes no Brasil, não há atualmente em nosso futebol um nome unânime para ser escolhido para dirigir a seleção. No início dos anos 80 e depois em 86, o nome de Telê Santana era indiscutível. Em 1994, se o nome de Parreira não era unânime, ele era um treinador renomado e muito respeitado. Na Copa de 98, Zagallo, além de tricampeão mundial, ele havia sido o coordenador técnico da seleção tetracampeã, ou seja, ele foi um nome de continuidade. Após 1998, novos nomes unânimes apareceram: Wanderley Luxemburgo, seguido por Felipão. Ninguém discutiu os retornos de Parreira e Felipão para os ciclos de 2006 e 2014 respectivamente. Tite, em 2016, alçou ao comando da Seleção Brasileira de forma incontroversa.
Não faço parte daqueles que acreditam que todos os treinadores brasileiros estão defasados taticamente em relação ao futebol europeu. Há treinadores estudiosos, que buscam se aperfeiçoar e entendem que é preciso superar o hiato entre o trabalho em campo e o conhecimento acadêmico. Mas, não vejo atualmente um nome que carregue a unanimidade dos torcedores brasileiros.
O falastrão treinador do Grêmio, Renato Gaúcho, criticou a possibilidade do Brasil ser comandado por um estrangeiro. Os argumentos por ele utilizados são frágeis e corporativistas. O primeiro argumento é que somos o país com mais títulos mundiais. É verdade, vencemos cinco Copas do Mundo, contudo perdemos outras dezessete. Outro contra-argumento é que a Holanda, que nunca venceu um Mundial, já produziu grandes treinadores que revolucionaram o futebol mundial, no entanto, pela ótica de Renato Gaúcho, a Real Associação Neerlandesa de Futebol, a CBF deles, deveria buscar um técnico entre os países campeões do mundo, afinal é apenas neste seleto universo que existiria vida inteligente para comandar uma seleção.
A metralhadora falante continuou: “A gente costuma falar com todo respeito, tem grandes treinadores lá fora também, mas é muito fácil você ter um time de R$ 1 bilhão. Põe um treinador brasileiro para treinar um time de R$ 1 bilhão lá fora, vamos ver”. O treinador do Grêmio ainda não aprendeu que o peixe morre pela boca.
Quando foi cobrado, em 2020, em relação à qualidade do futebol apresentado pelo Grêmio, ele afirmou: “Futebol bonito vocês têm que cobrar do Atlético Mineiro e do Flamengo. Essas duas equipes têm a obrigação de apresentar futebol bonito, pelo que gastaram. Se um dia a diretoria do Grêmio, o presidente do Grêmio falarem assim: ‘Olha, Renato, você tem R$ 200 milhões para contatar’. Aí pode me cobrar futebol bonito. Enquanto isso não acontecer, vai ter partidas com altos e baixos”. No ano seguinte, ele dirigiu o “clube de R$ 200 milhões”. Após um bom início no Flamengo, a qualidade técnica apresentada pela equipe despencou e Renato não conquistou nenhum título. Lógico que os investimentos são importantes para formar um time vitorioso, mas eles não são a única variável que precisa ser levada em conta e o fracasso de Renato Gaúcho é prova disso.
Se a ingênua hipótese construída por nosso principal personagem da crônica desta semana tivesse um fundo de verdade, a seleção campeã do mundo em 2022 seria a Inglaterra. Os seus atletas são avaliados em 1,49 bilhão de euros e o Brasil, mensurado em 1,45 bilhão de euros, teria realizado uma disputa acirradíssima com os inventores do futebol e teria sido vice-campeão. Na realidade, perdemos para a “pobre” Croácia, cotada em 478 milhões de euros. Não vamos nos deter em todas as seleções, mas vale a pena perceber que a campeã, a Argentina, amargaria, pela lógica monetária, uma longínqua 8° posição, uma vez que seus jogadores alcançaram o “o parco” valor de 748 milhões de euros. O treinador gaúcho não entende ou finge não entender que clubes e seleções não podem ser tratados pela mesma métrica, especialmente no que tange aos valores monetários.
O argumento de que o Brasil é uma mãe na medida em que não exigimos a carteirinha de treinador para os estrangeiros e que o brasileiro não consegue trabalhar lá fora por não ter a qualificação acadêmica exigida é outra questão, no mínimo, discutível. Renato e diversos outros treinadores exerceram a atividade de técnicos de futebol durante anos exatamente porque o Brasil não exigia que eles tivessem o certificado para exercer a profissão, ou seja, eles se beneficiaram do nosso caráter “materno”.
Para gerir um grupo de estrelas como é a Seleção Brasileira, repleto de vaidades, eu entendo que um treinador reconhecido, cascudo, experiente e, em certa medida, maior que os próprios jogadores, não é necessariamente sinônimo de êxito, mas pode se tornar um diferencial para que a equipe apresente um bom futebol e lute pelos principais títulos. Não encontro, entre os treinadores brasileiros em atividade, alguém que cumpra com tais requisitos.
É engraçado encontrar um treinador que defendeu nas últimas eleições o candidato dito liberal, mas que atua em favor de reserva de mercado quando se trata do seu espaço de trabalho. O nome disso é hipocrisia.