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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Visão de Jogo #6: Discordância de opiniões e desprezo pelos preconceitos

Em mais uma coluna para o Visão de Jogo, Luiz Henrique Borges analisou as diferenças de visão entre o articulista e um amigo, e como podemos discordar sem ofender

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Por Luiz Henrique Borges

O Professor Fábio Santa Cruz, além de um grande amigo, é também um estudioso do futebol, em particular do Centro-Oeste. Tenho grande respeito por suas opiniões, contudo nem sempre concordamos, mas como bons republicanos e democratas, buscamos, por meio do diálogo, preferencialmente regado por um bom chope, discutir nossas posições.

Defensor das fases eliminatórias no Campeonato Brasileiro, um autêntico “mata-matista”, após a vitória do América Mineiro sobre o Internacional, no dia de Finados, o Professor Fábio publicou nas suas redes sociais: “O gol do título do Palmeiras… foi marcado por Alê, do América de Minas Gerais. Ué! (Parabéns aos patetas responsáveis por essa patetice)”.

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Eu compreendo as diversas críticas tecidas em relação ao campeonato de pontos corridos, tais como: o título pode ser definido, como aconteceu em vários anos, antes da última rodada ou perdemos a emoção dos jogos finais ou, ainda, que os pontos corridos reduzem as possibilidades de as equipes menos estruturadas ganharem o título.

Eu entendo a insatisfação, mas não concordo com a afirmação que o meu amigo postou em suas redes sociais, ou seja, que o gol do título do Palmeiras foi marcado pelo jogador do América Mineiro. Na verdade, o Palmeiras ganhou o título em virtude da enorme consistência que mostrou ao longo das 35 rodadas do campeonato e isto não pode ser minimizado. O alviverde, até o momento, venceu 22 partidas e, ainda mais impressionante, perdeu apenas 2 confrontos. Em outras palavras, o gol do Alê significou apenas a antecipação do título que já estava conquistado e que seria, de qualquer forma, ratificado na noite de quarta-feira, após o Palmeiras golear o Fortaleza.

O sucesso, as vitórias e os títulos das equipes nos campeonatos de pontos corridos são decorrentes da organização e da formação de elencos fortes e tal fato diminuiu significativamente as oportunidades das equipes menos estruturadas e organizadas. No entanto, seus efeitos transbordaram também para os diversos campeonatos de mata-mata e não há mais espaço, há anos, para as surpresas e para as equipes desorganizadas administrativa e financeiramente, inclusive nos campeonatos estaduais, particularmente naqueles que possuem representantes na Série A.

O Palmeiras, desde a gestão de Paulo Nobre, dirigente que assumiu o clube logo após o rebaixamento para a Série B no final de 2012, promoveu um verdadeiro choque de gestão ao profissionalizar os diversos departamentos do clube. As gestões competentes se seguiram com Maurício Galiotte e Leila Pereira. Os bons resultados não são exclusivos do futebol profissional, mas eles se alastraram pelas categorias de base do alviverde, com conquistas nacionais no sub-13, sub-17 e sub-20.

Outro aspecto importante e que precisa ser ressaltado é a manutenção da vitoriosa comissão técnica. Abel Ferreira não está comemorando apenas o título brasileiro neste mês, mas também dois anos dirigindo o Palmeiras. Tenho certeza de que o torcedor palmeirense não se importou se o título foi conquistado antecipadamente e chegou um pouco mais cedo, com a vitória da equipe mineira. Ele só quer gritar Hendecacampeão.

O Flamengo, apesar de ter realizado um jogo sofrível, conquistou pela terceira vez a Copa Libertadores da América após vencer o Athletico Paranaense por 1X0. O rubro-negro do Paraná, exceto nos minutos iniciais do confronto, não conseguiu ameaçar o clube carioca. A expulsão do defensor Pedro Henrique, nos minutos finais da etapa inicial, abriu o caminho para o gol flamenguista. Neste ponto, entendo, juntamente com o meu chefe, Ruy Cesar, que o Felipão se equivocou. Acredito que o experiente treinador, sabendo que faltavam poucos minutos para o intervalo, resolveu adiar a substituição para recompor a defesa para conversar com a equipe no vestiário. Gabigol frustrou a manobra de Felipão e garantiu o título para o Flamengo em um jogo morno, quase sonolento.

Poderíamos abordar de forma mais aprofundada a final da Libertadores da América, no entanto, após as acirradas eleições presidenciais, a esposa do presidente do Flamengo, a senhora Angela Machado, que ocupa o cargo de Diretora de Responsabilidade Social do clube, divulgou em suas redes sociais um dos mais tristes e desprezíveis comentários depreciando as populações e a região que se posicionou contra o candidato que ela defendia. Não sei se o post foi criado por ela, uma vez que já havia lido no facebook de um conhecido: “Ganhamos onde se produz, perdemos onde se passa férias, bora trabalhar, pq se o gado morrer o carrapato passa fome”.

A Análise de Discurso nos ensina que as mensagens não estão expressas apenas no que foi dito, mas elas também devem ser lidas no interdito, nas entrelinhas e no silêncio. O construtor da frase xenófoba não precisou falar explicitamente que os seus ataques se dirigiam aos nordestinos, mas eles foram o alvo. Vários aspectos me espantam. Inicialmente, saber que a esposa do presidente do Flamengo é diretora de responsabilidade social e cidadania e a sua postagem, que obviamente reverbera o seu pensamento, se choca frontalmente com diversas diretrizes da diretoria por ela ocupada, em particular a terceira: “posicionar-se como clube defensor de direitos e inclusão social”.

Segundo aspecto, não sei se viver no Rio de Janeiro fez com que tal digna senhora tenha se esquecido de sua origem sergipana e nordestina. Também adoraria saber em que local a esposa do dirigente se formou em Serviço Social, pois certamente na sua grade curricular faltaram leituras básicas de antropologia, uma vez que os determinismos – geográficos e biológicos – e o evolucionismo já caíram em descrença no início do século XX.

Não sei se as pessoas que publicaram e divulgaram a repugnante postagem possuem capacidade cognitiva para ler e entender um Franz Boas, um Alfred Kroeber, dentre outros, por isto sugiro uma leitura bem mais básica, mas muito bem elaborada e marcada pelo rigor acadêmico, de um antigo professor do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília, o mineiro de Pouso Alegre, Roque de Barros Laraia: “Cultura: um conceito antropológico”. Talvez ela seja capaz de arejar as cabeças retrógradas, xenófobas e preconceituosas.

Por último, mas não menos importante, o post afirma, ganhamos onde se produz, perdemos onde se passa férias, ou seja, há uma clara divisão entre os estados que, supostamente, trabalham e não trabalham. Demonstrando limitada inteligência, o construtor da pérola se esquece que para ele curtir suas merecidas férias, os residentes estão trabalhando arduamente, ou seja, seguindo a mesma analogia do post, alguém poderia afirmar que o carrapato trabalha para que o gado possa colocar seu traseiro na sombra!

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